Cultura negra de Santa Luzia

23 de março de 2022 Off Por funes

Cultura negra de Santa Luzia por Ronaldo Magella

 

Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 30/07/2021 .

No dia 24 de novembro de 2021, a cidade de Santa Luzia completará 150 anos. Será o momento de lançar-se em muitos empreendimentos de resgate, de reconhecimento, de visibilidade, de fortalecimento e empoderamento de um povo, de uma cultura e de uma história. Nesse contexto, a história do povo negro de Santa Luzia precisa de mais atenção. Reconhecer a sua força, suas identidades, fortalecer a sua marca, tornar essa cultura cada vez mais viva e brilhante, permitindo que sua influência, que já é vasta, seja contemplada, afirmada e incorporada, proporcionando o resgate de memórias e a manutenção do patrimônio cultural.

Nunca é tarde para se corrigir ausências e faltas históricas. Esse reconhecimento é essencial como forma de recuperar o passado, muito silenciado, vilipendiado e esquecido, e que, se a história um dia cobrar o seu preço, penso que é possível se antecipar e iniciar o pagamento de dívida, amenizando os seus efeitos futuros. É inegável que precisamos ampliar essa discussão e fornecer meios para que haja uma validação, necessária e urgente, de políticas públicas voltadas a preservação da memória e da cultura do povo negro de Santa Luzia.

Às vezes, a melhor forma de ser universal é cantar a sua própria aldeia e Santa Luzia precisa olhar para si mesma e admirar-se com sua a própria cultura. Há muito tempo proponho um Festival da Cultura Negra aqui na cidade e o motivo é bem simples: toda a cultura do município tem raiz e identidade negra, toda a arte, a música, nascem de um rio, de uma fonte, nossa negritude, que se manifesta, acontece, é viva, é vida. A Festa do Rosário, a poesia e o coco de roda de Manoel de Bia, os Sanfoneiros do Talhado, o Talhado, o filme Aruanda, as louceiras do Talhado, os cantadores de viola, os emboladores de coco, arte e artesanato de barro, seu povo e sua gente, a cidade respira cultura negra. A identidade de um povo é a sua cultura, só que é preciso lembrar que nem sempre essa cultura é vista ou levada ao protagonismo.

O silenciamento sobre um povo ou uma marca identitária é uma forma de negação do outro, uma forma de desvalorização ou de uma tentativa de aniquilamento social através da memória, deixando traumas, sequelas e perdas. Não valorizar a cultura negra é perder a nossa maior identidade. Sendo assim, proponho que Santa Luzia seja reconhecida por seus traços culturais negros, que se crie o Dia da Cultura Negra de Santa Luzia, como forma de reconhecimento, valorização e resgate histórico. A ausência de ruas, praças, monumentos ou eventos exaltando a cultura negra na cidade mostra que precisamos, com urgência, refazer esse percurso, abrindo um espaço democrático e permitindo que essa voz narrativa de afirmação da própria identidade possa aflorar cada vez mais. A história e a cultura negra de Santa Luzia precisa ser contada e exaltada pelo seu próprio povo, por sua própria gente, permitindo que essas vozes sejam ouvidas, esses lugares sejam ocupados e essas memórias sejam preservadas.

Um dos maiores exemplos disso é o Quilombo do Talhado, palco do Cinema Novo. Não enxergar essa riqueza e esse patrimônio cultural é tomar partido pela omissão, pela negligência, pelo silenciamento e distanciamento de uma identidade, que é marca inegável da nossa histórica social, econômica e antropológica. Viva o povo Negro de Santa Luzia, viva a cultura Negra de Santa Luzia.